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O Crime do Século

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Explorando a origem, a dimensão e as consequências de uma das maiores tragédias da saúde pública da atualidade, com meio milhão de mortes por overdose só neste século, o documentário revela que a epidemia de opioides nos Estados Unidos é uma crise de saúde pública de procedência identificada.

O Crime do Século”, minissérie documental dirigida por Alex Gibney em 2021, ostenta um título à primeira vista verborrágico: foram tantos crimes no século passado, e muitos continuam impunes no novo século, o 21, que falar categoricamente sobre algum crime específico pode soar como mero recurso retórico. O caso em tela, entretanto, é daqueles que desafia a nossa combalida razão: desde o ano 2000, mais de 500 mil pessoas morreram de overdose de opióides nos EUA . Opióides, o que é isso? são compostos químicos psicoativos que produzem efeitos farmacológicos semelhantes aos do ópio ou de substâncias nele contidas. Mas, atenção: não se trata de crise conjuntural, ou pandemia – pelo contrário, não há nada de aleatório nessa tragédia. Foi resultado de uma estratégia deliberada de empresas farmacêuticas de aumentar suas margens de lucro, combinada com a cumplicidade de médicos, políticos e autoridades governamentais do setor. Uma tempestade perfeita de ganância e má fé, em suma.

Dividido em dois capítulos de duas horas, “O Crime do Século” detalha com minúcias decisões das empresas Purdue Pharma e Insys Therapeutics tomadas com o objetivo de ampliar desmesuradamente o mercado de remédios de “administração da dor” – este é o jargão industrial, pain management – resultando, para o espectador perplexo, num retrato contundente de dirigentes sociopatas e alianças políticas que viabilizaram esse desatino inacreditável. Em paralelo, depoimentos daqueles que perderam entes queridos para o vício das pílulas, assim como de policiais e paramédicos que responderam a chamadas emergenciais de casos de overdose – fornecem o contraponto. E o mais patético, nesse ambiente de contrastes patéticos: um raio-X implacável da família Sackler, proprietária da Purdue e uma das dinastias filantrópicas mais prolíficas da América, que quintuplicou sua fortuna com o analgésico prescrito OxyContin – e doou somas polpudas a museus e universidades, na boa tradição do capitalismo exacerbado (e culpado) na terra do Tio Sam.

Seções monumentais de museus como o Metropolitan e o Guggenheim, ambos em Nova York, para citar os mais famosos, materializaram-se graças a generosos aportes da família. Na década de 1960, Arthur Sackler começou a aplicar técnicas de publicidade no marketing da empresa para ajudar na venda dos medicamentos Librium e Valium – e com isso estabelecendo um precedente perverso para a marca OxyContin, lançada em 1996. Filantropia fazia parte da estratégia publicitária, claro: Arthur amealhou a segunda maior coleção de arte chinesa no mundo, entre outras predileções artísticas, cedida a Smithsonian após sua morte em 1987 (os irmãos Mortimer e Raymond, igualmente psiquiatras como Arthur, não tinham, digamos, esse pendor). Em 2017, os Sacklers alcançaram um patrimônio líquido coletivo de 13 bilhões de dólares.

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OxyContin: este seria o vilão entre vilões das drogas legais que fizeram esse estrago incalculável. Em princípio voltada para alívio de dores em pacientes terminais, sobretudo câncer – um mercado restrito, portanto – a droga deu um salto mercadológico em 1995, quando a Purdue assediou o Dr. Curtis Wright, funcionário da poderosa FDA, Federal Drug Administration. O objetivo foi garantir que o OxyContin recebesse selo de aprovação com indicação na bula de que (1) a absorção lenta da droga no corpo diminuía o potencial de abuso; e (2) a droga era apropriada para uma ampla gama de doenças, desde a luta contra o câncer até o tratamento de dores no joelho. Wright acabou largando a FDA e indo trabalhar…na Purdue.

Nenhuma dessas alegações da bula tinha evidências suficientes: o conluio com a FDA e seu técnico corrupto viabilizou a aprovação, algo inimaginável para o standard ético que se atribui ao órgão – no Brasil, a ANVISA é a agência encarregada de aprovar medicamentos: sua atuação recente na pandemia do Covid, por exemplo, dá uma ideia da importância desse setor governamental para a saúde pública. “O Crime do Século” revela documentos e tratativas sobre o absurdo que ocorreu na FDA, além de mergulhar fundo na descrição dos falsos testemunhos no Congresso de membros do alto escalão do grupo, sem falar nos processos judiciais que geraram acordos de centenas de milhões de dólares – apenas uma fração diante dos bilhões de lucros.

O mesmo rigor investigativo foi aplicado à Insys Therapeutics, na segunda parte da minissérie. Aliás, nessa lista mortífera de empresas perfeitamente legais com projetos mórbidos inclui-se a Johnson & Johnson, que não fabrica apenas xampu para bebês. A empresa incentivou agricultores na Tasmânia, ilha na Austrália que sempre produziu papoula – insumo básico dos opioides – em escala controlada, a aumentar a produção para satisfazer o mercado em expansão nos EUA, financiando: (1) colheitas mecânicas em vez de manual; e (2) modificações genéticas da planta para criar “super” papoulas. Bônus especiais foram também oferecidos aos agricultores que produziram as maiores safras. Tudo isso quando notícias de abusos e overdoses nas cidades americanas já eram notórias – abusos que incluíam aumento desenfreado do mercado ilegal dos remédios, que passaram a ser consumidos depois de esmagados e inoculados pelo nariz ou com seringas.